Submarino francês com preço nas alturas
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Equipamento francês que Brasil comprará custará dez vezes mais que o da oferta feita por empresa alemã
José Meirelles Passos
O governo do Brasil está prestes a adquirir da empresa estatal francesa DCNS (Direction des Constructions Navales Services) quatro submarinos convencionais, da classe Skorpène, mais o casco — um pouco maior — de uma quinta embarcação desse tipo, pagando dez vezes mais caro do que uma outra oferta.
Anteriormente, a empresa privada alemã HDW (HowaldtswerkeDeutsche Werft) oferecera um pacote semelhante por um décimo do preço.
A justificativa para o negócio com a França custar 6,7 bilhões de euros — contra os 670 milhões de euros cobrados pela firma da Alemanha — é a de que o pacote incluirá a construção de um estaleiro e de uma base naval, na área de Itaguaí, no litoral do Rio de Janeiro. Essas obras, no entanto, não tinham sido planejadas pelo Brasil.
Elas foram incluídas no pacote pelo governo francês como condição para a venda dos submarinos, mais a transferência de tecnologia para a sua construção no país. Para ter as embarcações, o Brasil teria de concordar tanto em adquirir aquelas duas instalações — gasto extra considerado desnecessário inclusive por altos oficiais da Marinha — como, também, aceitar que elas sejam projetadas na França e construídas por uma firma indicada pelos franceses.
Eles impuseram que as obras ficassem nas mãos da brasileira Odebrecht. Dessa forma, deixou de existir, na prática, um procedimento que visa — entre outras coisas — a fazer com que se evite desperdício de fundos públicos: uma licitação. Perguntado a respeito pelo GLOBO, na última terçafeira, o ministro da Defesa, Nelson Jobim, esquivou-se: — Nós não temos nada a ver com isso. Compramos um pacote pronto. O fato de a França colocar as obras em mãos da Odebrecht tem a ver com um acordo de parceria realizado entre eles — justificou.
Jobim será chamado a depor em comissão Por conta disso, a Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional, da Câmara dos Deputados, já obteve a aprovação para realizar uma audiência pública sobre o assunto. Ela deve acontecer antes que os dois países assinem um contrato definitivo.
Jobim, que será chamado a depor, chegou ontem a Paris para, entre outras coisas, negociar um financiamento para o pacote dos submarinos.
O governo pretende assinar um contrato no próximo dia 7 de setembro, quando o presidente Nicolas Sarkozy virá ao país para as comemorações da Independência brasileira. O deputado Júlio Delgado (PSBMG), que propusera a audiência pública, foi irônico ao comentar a transação: — Nós estamos simplesmente comprando um prato pronto cujo ingrediente está vencido — afirmou, em referência ao fato de que os submarinos Scorpène são considerados inferiores aos que o Brasil possui e que foram construídos no Arsenal de Marinha, no Rio, com transferência de tecnologia da alemã HDW. São cinco embarcações da categoria IKL 209.
O Tupi foi feito em Kiel, na Alemanha, para onde foram enviados 80 brasileiros — engenheiros militares e civis, técnicos e operários — para treinamento. Tamoio, Timbira, Tapajó e Tikuna foram produzidos no Arsenal de Marinha sob a supervisão de apenas um engenheiro alemão.
Um dos aspectos mais intrigantes na decisão do Ministério de Defesa de adquirir os Scorpène é o fato de que nem a própria Marinha da França, nem a de qualquer outro país da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), terem jamais utilizado uma embarcação desse tipo.
Apenas três submarinos desses estão em atividade no mundo.
Dois adquiridos pelo Chile e um pela Malásia. O próprio diretor de estratégia e desenvolvimento da DCNS, Jacques Mouysset, vem defendendo a necessidade de aquela empresa trabalhar em novos modelos para, como disse ao portal “Mer et Marine”, “não se deixar distanciar tecnologicamente”.
Empresa alemã domina 81% do mercado mundial A questão é que o Scorpène foi concebido há mais de dez anos, sendo herdeiro do casco do submarino tipo Rubis, versão Amethyste. Outro dado de mercado ilustra também a diferença entre os produtos disponíveis para a Marinha do Brasil, levantando suspeitas sobre a qualidade dos escolhidos.
Um relatório elaborado por oficiais da Marinha brasileira, que tomaram como base relatos de colegas que já operaram os Scorpène adquiridos pelo Chile, registrou fragilidades no sistema.
O documento afirma que “a manutenção é cara e complexa”, e que a qualidade do material é inferior ao do modelo alemão.
A aceitação dos submarinos (de várias classes) da HDW tem sido bem maior: a empresa domina 81% do mercado mundial, enquanto a DCNS tem 13%. Nos últimos três anos, a empresa alemã entregou 17 deles a cinco países. A francesa não entregou nenhum.